Alguns Excertos sobre propriedade Privada em Marx
A partir de, Rodrigo Guerón,D&G, Jorge Grespan e Marx em Grundrisse
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As semelhanças entre o nascimento da psicanálise e o nascimento da economia política, segundo Deleuze e Guattari, são inúmeras.
De fato, Marx assinala que a descoberta da essência da produção no trabalho — a descoberta do trabalho abstrato — , feita pela economia política, é imediatamente frustrada e limitada à medida que os economistas políticos vinculam e submetem a produção do sujeito à propriedade privada.
Os dois autores franceses fazem então, nesse ponto, uma observação extremamente singular, qual seja, eles afirmam que a psicanálise fez o mesmo movimento que a economia política não apenas quando descobriu, como esta última, a produção no sujeito, mas também quando frustrou sua descoberta — a libido, o desejo — , remetendo-a ao triângulo edipiano e, portanto, à estrutura da família burguesa.
Quando Marx critica o movimento de remeter toda a produção à propriedade privada e, portanto, ao capital, está apontando um movimento de mistificação da produção; ou melhor, de mistificação da “origem” da produção.
Vincular a produção à propriedade privada é a forma como o Capital coloca a si mesmo como “pressuposto natural e divino”
Marx nos aponta, pois, que toda a potência da descoberta do trabalho abstrato pela economia política se esvazia na sujeição daquele à propriedade privada, em particular à propriedade privada dos meios de produção típica do capitalismo. É como se a operação de vinculação do trabalho à propriedade privada, que é na verdade uma operação de fazer com que toda a produção seja concebida como vinda diretamente do Capital, fosse o maior de todos os fetichismos do capitalismo: o fetichismo dos fetichismos.
Rodrigo Guerón
Marx multiplica exemplos históricos de comunidades nas quais não havia
propriedade privada para mostrar que, nelas, a dimensão social do trabalho já aparecia diretamente na esfera da produção, sem a mediação da troca de mercadorias.No capitalismo, ao contrário, a mediação existe e avança à medida que a forma mercadoria se alastra por todos os segmentos da vida social.
Assim, as relações sociais não se apresentam como vínculo entre pessoas, e sim como vínculo entre coisas, assumindo as qualidades objetivas das coisas, especialmente sua aparência de força externa ao mundo humano, de realidade natural e eterna.
Essa força parece dividir o trabalho entre os produtores e criar as necessidades e os desejos dos consumidores, ao mesmo tempo em que mantém intocáveis instituições como a propriedade privada.
Contudo, há um fenômeno mais complexo em jogo.
No esvaziamento capitalista da consciência ligada à produção da vida, operam mecanismos que podem ser chamados de representação prática e que vão desde o simples uso do dinheiro nas trocas até as figuras complexas do capital financeiro e da renda monetária sobre a propriedade privada ( espetáculo?*)
Em todos esses momentos, a propriedade privada confere ao capital o poder de representação prática. A partir dessa forma fundamental da representação, desenvolvem-se outras formas mais complexas, sempre baseadas no direito de propriedade. ( espetáculo?*)
Por exemplo, com a expansão da escala de produção, parte do capital das
empresas vem de terceiros, como de bancos que lhes concedem crédito ou de acionistas da bolsa de valores.Esses novos agentes têm direito de propriedade sobre elas na forma de títulos sobre lucros futuros.
À medida que se desenvolve nessa direção, o sistema se distancia da verdadeira fonte criadora do valor, o trabalho ( apropriação natural de fato no sentido primário marxiano), e se aproxima da propriedade privada excludente do trabalho( espetacularizado*), transformada em princípio organizador da produção e da vida social.
Por esse processo de representação, o trabalho deixa de ser o eixo da sociedade, que passa a girar em torno da propriedade privada.(espetáculo?*)
“Ser radical é agarrar as coisas pela raiz” Marx descobriu que a raiz desse conflito é a propriedade privada dos meios de produção, da qual os trabalhadores são excluídos, tornando-se meros assalariados.
A partir desse diagnóstico do presente, Marx constatou que a distribuição assimétrica dos meios de produção havia determinado a vida social também em outras épocas da história, cindindo as sociedades em grupos opostos, conforme dividissem entre si os meios que garantiam sua sobrevivência.Jorge Grespan
Toda produção é apropriação da natureza pelo indivíduo no interior de e mediada por uma determinada forma de sociedade. Nesse sentido, é uma tautologia afirmar que propriedade (apropriação) é uma condição da produção. É risível, entretanto, dar um salto daí para uma forma determinada de propriedade, por exemplo, para a propriedade privada. (O que, além disso, presumiria da mesma maneira uma forma antitética, a não propriedade, como condição.) A história mostra, pelo contrário, a propriedade comunal (por exemplo, entre os hindus, os eslavos, os antigos celtas etc.) como a forma original, uma forma que cumpre por um longo período um papel significativo sob a figura de propriedade comunal. Está totalmente fora de questão aqui indagar se a riqueza se desenvolveria melhor sob essa ou aquela forma de propriedade. Mas dizer que a produção e, por conseguinte, a sociedade são impossíveis onde não existe qualquer forma [de] propriedade é uma tautologia. Uma apropriação que não se apropria de nada é uma contradictio in subjecto.
Marx — Grundrisse
- *Acréscimos nossos como sugestões interpretativas.